Neurologista e professor da Faculdade de Medicina da
Universidade Federal de Minas Gerais, Paulo Caramelli explica, que durante o
processo de envelhecimento, ocorrem modificações fisiológicas naturais do
cérebro, que se apresentam como a perda de memória e da velocidade de
processamento de informações. Essas alterações são próprias da idade, mas não
podem interferir de modo significativo na autonomia do indivíduo.
“O que se tem são modificações leves de memória. Lembrando
que até o jovem pode ter algum esquecimento ocasional. No idoso, não é
diferente. O indivíduo pode ter alguma alteração, especialmente quando tem que
lidar com muitas informações simultaneamente. Talvez, secundariamente, seja
nisso que a memória se altera nos mais velhos em relação aos mais novos. Porque
uma de suas dificuldades mais comuns é a de processar muitas informações ao
mesmo tempo”, aponta Caramelli.
Rosamaria Peixoto Guimarães, presidente da Sociedade Mineira
de Neurologia, esclarece que, durante nossa vida, perdemos neurônios, desde o
momento do nascimento. Como temos bilhões dessas células, não sentimos essa
perda. Mas, ao se atingir uma idade mais avançada, ela fica mais perceptível.
“O envelhecimento como um todo, não só no aspecto cerebral, atinge o corpo
inteiro. Suas articulações não são mais as mesmas, a coluna, o coração. E
ninguém fala que isso é uma doença. Isso seria a senilidade, um estágio da
vida. No cérebro, ocorre exatamente a mesma coisa, só que com a singularidade
de os neurônios não se regenerarem. Ao chegarmos aos 70, 80 anos, existe sim
uma queda natural na velocidade de raciocínio e uma perda de memória episódica,
para fatos mais corriqueiros”, afirma.
Alerta
O limite entre a falha de memória ocasional e um sinal de
problema maior é sutil. Paulo Caramelli alerta que é importante observar se o
esquecimento começou a trazer prejuízo ao indivíduo. Não lembrar de
acontecimentos recentes também é indicativo que há algo de errado. O papel da
família no sentido dessa observação, segundo o professor, é muito importante.
“Esquecer fatos recentes de experiências marcantes, como ir
ao cinema assistir a um filme, deve servir de alerta. Outra coisa é quando há
uma desproporção entre a percepção do indivíduo, no caso, o idoso, sobre a sua
memória e a de um familiar, que percebe as falhas de memória mesmo que não haja
queixa da pessoa. Nos casos mais preocupantes, que podem refletir uma doença
mais séria, subjacente, a percepção do paciente é menor do que a de um
familiar. Isso é muito importante, porque existem muitas situações, doenças,
que podem interferir com a memória. Depressão, por exemplo, que é uma condição
relativamente frequente”, observa Caramelli. Efeitos de medicamentos,
especialmente sedativos e ansiolíticos, alterações no sono, álcool, entre
outros, são fatores que podem interferir na memória e concentração, segundo o
professor. Essas nuances reforçam a necessidade de, ao se sentir uma alteração
mais substancial, procurar um profissional com experiência na área.
“A indicação é de se procurar um neurologista ou geriatra.
Mas pode ser um cardiologista ou clínico geral. Até o ginecologista pode
encaminhar o paciente para especialistas. O melhor é que seja um profissional
que já conheça e acompanhe a pessoa, que seja de confiança da família”, orienta
Rosamaria Guimarães.
Prevenir é o melhor remédio
Conseguir evitar ou retardar os efeitos da perda de memória
que pode levar a quadros iniciais de demência está diretamente ligado à maneira
que o indivíduo leva sua vida e cuidados com sua saúde. A neurologista Rosamaria
Guimarães indica estudos já comprovados que relacionam a escolaridade como
fator protetor da saúde mental nos idosos. “Mas não adianta fazer isso ao
envelhecer, de última hora”, completa.
Paulo Caramelli destaca que a prevenção da demência, doença
de Alzheimer e declínio cognitivo pode ser dividida em quatro pilares de
cuidado com a saúde, que, quanto antes começarem a fazer parte da vida da
pessoa, melhor. Primeiro é o controle rigoroso de fatores de risco vascular.
“Quem é hipertenso tem que tratar e se cuidar adequadamente. O diabético, idem.
Fuma? Tem que parar de fumar”, afirma.
Segundo é se manter ativo cognitivamente, diversificando ao
máximo as atividades, que, quanto mais desafiadoras, melhor. “Leitura é uma
atividade fantástica. Jogos, principalmente os que demandem estratégia.
Palavras cruzadas é bom? Sim. Mas tem vir acompanhado de outras atividades”,
explica Caramelli.
“Fazer coisas corriqueiras de forma diferente. Quando
destro, escovar o dente com a mão esquerda e vice-versa. Isso vai ativar áreas
do cérebro que geralmente não são utilizadas. Somos preguiçosos e utilizamos
sempre as mesmas vias de transmissão. Quando se faz isso, uma nova via cerebral
que está sendo utilizada é estimulada.
Tente fazer caminhos diferente quando for ao trabalho ou explorar um bairro que
você não costuma passar. Isso tudo ajuda”, completa Rosamaria Guimarães.
Em terceiro lugar, vem a prática de alguma atividade física,
principalmente aeróbica. A recomendação é de, no mínimo, 150 minutos semanais
de exercício. Por último, mas não menos importante, fica uma dieta balanceada e
saudável. “Linhaça, salmão, peixes em geral. O consumo do ômega 3,
comprovadamente, melhora a neurotransmissão”, oriente a neurologista.